Grau de invasão por flora exótica: sugestões para uma rápida quantificação e inclusão dessa informação em cada registo no iNaturalist

Desde que comecei a utilizar o iNaturalist há cerca de um ano, uma das principais preocupações foi o mapeamento das espécies exóticas invasoras e a quantificação da sua presença em cada local. Comecei a "carimbar" as fotografias com as coordenadas GPS e a agrupar as fotografias em "quadrículas" com base nessas coordenadas, para obter uma amostra mais representativa do estado de conservação de cada local (cada "quadrícula"). Concluí que uma forma simples de efetuar esse agrupamento seria truncar as coordenadas com 3 casas decimais, o que corresponde a arredondar por defeito à milésima do grau: cada "quadrícula" assim definida, com 0,001 graus de latitude por 0,001 graus de longitude, tem aproximadamente a forma de um retângulo com 111 metros de altura (norte-sul) por 85 metros de largura (este-oeste) à latitude de 40 graus (a largura varia com a latitude), corresponde a cerca de 1 hectare. Assim, a referência para quantificação do grau de invasão passou a ser uma área de 1 ha em redor do local de observação. Considerando uma área circular em vez de retangular, isto corresponderia a um raio de cerca de 60 metros.

Em seguida houve a necessidade de definir uma escala de invasão por flora exótica. A primeira escala era inteiramente qualitativa, baseada numa avaliação subjetiva do risco de invasão ou do esforço necessário para reverter essa invasão [1, comentários] [2]. Em seguida houve uma tentativa de converter os critérios subjetivos em critérios mais objetivos baseados no esforço humano necessário para reverter a invasão numa área de 1 ha [3]. Houve ainda uma tentativa de converter horas de trabalho em número de plantas ou percentagem de área invadida. No entanto, a diversidade de critérios (horas de trabalho, número de plantas, área invadida) complicava a implementação da escala.

Já nessa fase se reparou que parecia existir um fator de 5 entre a área máxima invadida em cada nível e a área máxima invadida no nível seguinte. Este crescimento aproximadamente exponencial (nos níveis inferiores) é compatível com um modelo logístico, o qual costuma descrever bem a expansão de populações de seres vivos. Assim, a certa altura tentou-se ajustar uma função logística a alguns pares (nível de invasão, percentagem máxima de área invadida) [4]. No entanto, algumas das percentagens máximas de área invadida não eram fáceis de memorizar. Assim, optou-se por fixar "valores de corte" mais simples [5].

Esta última versão da escala, definida a 15 de março de 2021, não sofreu mais alterações e pode ser definida resumidamente da seguinte forma:

  • Nível 0: probabilidade de invasão num prazo de 5 anos inferior a 50%.
  • Nível 1: probabilidade a 5 anos superior ou igual a 50% mas sem invasão visível no momento da observação.
  • Níveis 2-6: a percentagem máxima de área invadida segue uma progressão geométrica de razão 5; o nível de invasão 5 corresponde a um máximo de 5% de área invadida.
  • Níveis 6-8: a percentagem mínima de área não invadida segue uma progressão geométrica de razão 1/5.

Como registar o nível de invasão em cada observação no iNaturalist?

  • Uma forma simples é preencher o campo "Invasion extent" [1], cujas opções de preenchimento descrevem resumidamente cada um dos 10 níveis de invasão.
  • Outra possibilidade é acrescentar a cada observação uma etiqueta (tag) correspondente ao nível de invasão. Em [1, comentários] e [2] é sugerida uma etiqueta para cada nível de invasão.
  • Outra possibilidade ainda mais simples é escrever uma das abreviaturas i0, i1, ..., i9, logo no início da descrição da observação. Este procedimento tem diversas vantagens: as descrições são pesquisáveis (mais facilmente do que os campos), podem ser exportadas (tal como as etiquetas e os campos) e são fáceis de inserir na aplicação para telemóvel (os campos apenas podem ser preenchidos na aplicação adicionando a observação a um projeto que esteja associado a esse campo; aparentemente não existe qualquer forma de adicionar etiquetas usando a aplicação). A principal desvantagem é a necessidade de memorizar as definições dos 10 níveis da escala.

Eis a escala completa. Para cada nível é indicado o código abreviado (para inserir no início da descrição da observação quando a mesma é registada na aplicação para telemóvel), a etiqueta correspondente a esse nível (a qual pode ser usada se o registo for efetuado através da página web), a definição baseada em percentagem de área invadida (definição que deve ser considerada sempre que possível), uma definição quantitativa alternativa baseada no esforço necessário para reverter a invasão e a definição qualitativa original (definição que deverá ser considerada quando não for viável aplicar as anteriores).
A avaliação do nível de invasão é sempre realizada considerando uma área de 1 hectare (cerca de 60 metros de raio) em redor do local de observação. É perfeitamente tolerável uma incerteza de 1 nível na avaliação do grau de invasão.

  • i0
    invasion: 0 - absent
    Probabilidade de invasão nos próximos 5 anos inferior a 50%.
    Não foram avistadas plantas de espécies exóticas invasoras no local nem nas imediações.

  • i1
    invasion: 1 - likely
    Probabilidade de invasão nos próximos 5 anos superior ou igual a 50%.
    Foram avistadas plantas de espécies exóticas invasoras nas imediações mas não num raio de 60 metros.
    Também poderá considerar-se uma invasão de nível 1 se existirem no local poucas plantas de espécies exóticas que ainda não apresentam comportamento invasor - por exemplo Cyperus eragrostis, Eucalyptus sp., Medicago arabica, Oenothera rosea, ou mesmo Erigeron sumatrensis em alguns locais.

  • i2
    invasion: 2 - beginning
    Área invadida inferior ou igual a 0,04% - 4 metros quadrados por hectare (aproximadamente a área de um automóvel). [Esta avaliação deve ter em conta a densidade de plantas: se forem observadas poucas plantas dispersas por uma área significativa, deve imaginar-se a área que seria ocupada pelo mesmo número de plantas numa mancha densa. Por exemplo: uma mancha densa de mimosas jovens na iminência de começar a produzir semente - cerca de 3 anos de idade, 3 metros de altura, 4 cm de diâmetro do tronco - pode ter cerca de meia dezena de plantas por metro quadrado; assim, se numa área de 1 hectare em redor do local de observação existirem até 20 acácias jovens dispersas, poderá considerar-se uma invasão de nível 2.]
    A eliminação definitiva das plantas de espécies exóticas invasoras requer no máximo 10 horas de trabalho voluntário (apenas com utensílios manuais), por exemplo um grupo de dimensão familiar intervindo durante parte de uma manhã.

  • i3
    invasion: 3 - significant
    Área invadida inferior ou igual a 0,2% - 20 metros quadrados por hectare (aproximadamente a dimensão de uma sala ou garagem).
    A eliminação definitiva das plantas de espécies exóticas invasoras requer no máximo 50 horas de trabalho voluntário (apenas com utensílios manuais), por exemplo um grupo organizado intervindo durante uma ou duas manhãs.

  • i4
    invasion: 4 - massive
    Área invadida inferior ou igual a 1% - 100 metros quadrados por hectare (aproximadamente a dimensão de uma casa).
    A eliminação definitiva das plantas de espécies exóticas invasoras requer no máximo 20 horas de trabalho especializado (por exemplo com motosserras e aplicação de herbicida), compatível com os meios humanos e técnicos de uma autarquia ou de uma associação de produtores florestais.

  • i5
    invasion: 5 - overwhelming
    Área invadida inferior ou igual a 5% - 500 metros quadrados por hectare (aproximadamente a dimensão de um campo de futsal).
    A eliminação definitiva das plantas de espécies exóticas invasoras requer no máximo 100 horas de trabalho especializado, apenas viável no âmbito de um projeto com financiamento externo especificamente orientado para o restauro de ecossistemas.

  • i6
    invasion: 6 - irreversible
    Área invadida inferior ou igual a 25%, área não invadida superior ou igual a 75%.
    A eliminação definitiva das plantas de espécies exóticas invasoras seria tão onerosa que se torna impossível na prática. No entanto é possível conter a invasão, impedindo a expansão da mancha invadida.

  • i7
    invasion: 7 - uncontrollable
    Área invadida inferior ou igual a 85%, área não invadida superior ou igual a 15%.
    As plantas de espécies exóticas invasoras são tão abundantes que já não será possível impedir a expansão da mancha invadida. No entanto, ainda é possível observar no local a maioria das espécies autóctones que estariam presentes antes da invasão.

  • i8
    invasion: 8 - finalising
    Área invadida inferior ou igual a 97%, área não invadida superior ou igual a 3%.
    Além de já não ser possível impedir a expansão ou adensamento da mancha invadida, também já é percetível uma marcada redução da biodiversidade autóctone, permanecendo apenas alguns exemplares ou pequenas manchas das espécies outrora mais abundantes (por exemplo Arbutus unedo, Cistus psilosepalus, Daphne gnidium, Genista triacanthos, Genista tridentata, Phillyrea angustifolia, Pteridium aquilinum, Quercus robur, Quercus suber).

  • i9
    invasion: 9 - complete
    Área invadida superior a 97%, área não invadida inferior a 3%.
    A invasão atingiu praticamente o seu auge, com densidade máxima de flora exótica e presença mínima de flora autóctone. Poderão restar algumas espécies autóctones que conseguem coexistir com as espécies exóticas (por exemplo alguns fetos e gramíneas) ou exemplares isolados de outras espécies que já não conseguem produzir descendência (por exemplo medronheiros, carvalhos ou castanheiros isolados, cujas sementes já não germinam devido ao ensombramento ou alterações no solo resultantes da invasão por espécies exóticas).

[1] https://www.biodiversity4all.org/observation_fields/12426
[2] https://www.inaturalist.org/journal/mferreira/40453-uma-escala-para-avaliar-a-presenca-de-especies-exoticas-invasoras-em-cada-local
[3] https://www.biodiversity4all.org/journal/mferreira/42127-criterios-objetivos-para-a-determinacao-do-nivel-de-invasao-por-flora-exotica
[4] https://www.biodiversity4all.org/journal/mferreira/47719-fixacao-de-criterios-para-a-determinacao-do-nivel-de-invasao-por-acacias-com-base-na-percentagem-de-area-invadida
[5] https://www.biodiversity4all.org/journal/mferreira/47736-nivel-de-invasao-por-especies-exoticas-escala-simplificada-baseada-na-percentagem-de-area-invadida

Posted on July 23, 2021 01:25 PM by mferreira mferreira

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